sábado, 30 de abril de 2011




Acho que sábado é a rosa da semana; sábado de tarde a casa é feita de cortinas ao vento, e alguém despeja um balde de água no terraço; sábado ao vento é a rosa da semana; sábado de manhã, a abelha no quintal, e o vento: uma picada, o rosto inchado, sangue e mel, aguilhão em mim perdido: outras abelhas farejarão e no outro sábado de manhã vou ver se o quintal vai estar cheio de abelhas.

No sábado é que as formigas subiam pela pedra.

Foi num sábado que vi um homem sentado na sombra da calçada comendo de uma cuia de carne-seca e pirão; nós já tínhamos tomado banho.

De tarde a campainha inaugurava ao vento a matinê de cinema: ao vento sábado era a rosa de nossa semana.

Se chovia só eu sabia que era sábado; uma rosa molhada, não é?

No Rio de Janeiro, quando se pensa que a semana vai morrer, com grande esforço metálico a semana se abre em rosa: o carro freia de súbito e, antes do vento espantado poder recomeçar, vejo que é sábado de tarde.

Tem sido sábado, mas já não me perguntam mais.

Mas já peguei as minhas coisas e fui para domingo de manhã.

Domingo de manhã também é a rosa da semana.

Não é propriamente rosa que eu quero dizer.


Texto extraído do livro "Para não Esquecer", Editora Siciliano - São Paulo, 1992.

[Clarice Lispector]

terça-feira, 26 de abril de 2011




Quando nasci um anjo esbelto,desses que tocam trombeta, anunciou: vai carregar bandeira(…)Vai ser coxo na vida é maldição para homem.Mulher é desdobrável. Eu sou.


[Adélia Prado]



Eu quero uma licença de dormir,
perdão pra descansar horas a fio,
sem ao menos sonhar
a leve palha de um pequeno sonho.
Quero o que antes da vida
foi o sono profundo das espécies,
a graça de um estado.
Semente.
Muito mais que raízes. (Exausto)

[Adélia Prado]

segunda-feira, 25 de abril de 2011





"Nada me prende a nada. Quero cinquenta coisas ao mesmo tempo."

[Álvaro de Campos]



"Nada de estéticas com o coração: sou lúcido"


[Alvaro de Campos]




"é o mesmo que antes
ou que da outra vez
ou da vez anterior à essa.
eis um pau
e eis uma boceta
e eis um problema.

a cada vez
você pensa
bem eu aprendi desta vez:
vou dizer a ela que faça isso
e eu farei isto,

já não quero a coisa toda,
só um pouco de conforto
e um pouco de sexo
e apenas um mínimo de
amor.

agora novamente espero
e os anos vão escasseando.
tenho meu rádio
e as paredes da cozinha
são amarelas.
sigo esvaziando as garrafas
à espera
dos passos.

espero que a morte reserve
menos do que isto."

[Charles Bukowsk]



"Meu verso é minha consolação. Meu verso é minha cachaça. Todo mundo tem sua, cachaça."



[Carlos Drummond de Andrade]



"Ainda que sendo tarde e em vão, perguntarei por que motivo tudo quanto eu quis de mais vivo tinha por cima escrito: 'Não!'"


[Cecilia Meireles]



"Fique de vez em quando sozinho, senão você será submergido. Até o amor excessivo dos outros pode submergir uma pessoa."


[Clarice Lispector]

sábado, 16 de abril de 2011




'Se o tal "amor" é impontual e imprevisível que se dane! Não adianta: as pessoas são impacientes! São e sempre vão ser! Tem gente que diz que não é. "Eu não sou ansioso, as coisas acontecem quando tem que acontecer." Mentira! Por dentro todo ser humano é igual: impaciente, sonhador, iludido. Jura de pé junto que não, mas vive sempre em busca da famosa cara metade! Pode dar o nome que quiser: amor, alma gêmea, par perfeito, a outra metade da laranja... No fim dá tudo no mesmo. Pode soar brega, cafona. Mas é a realidade. Inclusive o assunto "amor" é sempre cafonérrimo. Acredito que o status de cafona surgiu porque a grande maioria das pessoas nunca teve a oportunidade de viver um grande amor. Poucas pessoas experimentaram nesta vida a sensação de sonhar acordada, de dormir do lado do telefone, de ter os olhos brilhando, de desfilar com aquele sorriso de borboleta azul estampado no rosto.

[Luis Fernando Verissimo]

terça-feira, 12 de abril de 2011




"Mas tantas memórias. A gente tem tantas memórias. Eu fico pensando se o mais difícil no tempo que passa não será exatamente isso. O acúmulo de memórias, a montanha de lembranças que você vai juntando por dentro. De repente o presente, qualquer coisa presente. Uma rua, por exemplo. A rua não é mais a mesma, demoliram o edifício. As ruas vão mudando, os edifícios vão sendo destruídos. Mas continuam inteiros dentro de você. Chega um tempo, eu acho, que você vai olhar em volta sem conseguir reconhecer nada."


[Caio Fernando Abreu]

segunda-feira, 11 de abril de 2011





"A esperança é uma droga alucinógena".


[Rubem Alves]
"Bendito quem inventou o belo truque do calendário, pois o bom da segunda-feira, do dia 1º do mês e de cada ano novo é que nos dão a impressão de que a vida não continua, mas apenas recomeça..."


[Mário Quintana]

domingo, 10 de abril de 2011




"Que esta minha paz e este meu amado silêncio não iludam a ninguém. Não é a paz de uma cidade bombardeada e deserta. Nem tampouco a paz compulsória dos cemitérios. Acho-me relativamente feliz. Porque nada de exterior me acontece... Mas, em mim, na minha alma, pressinto que vou ter um terremoto!"

[Mario Quintana]

quinta-feira, 7 de abril de 2011




"Quanto mais ando, querendo pessoas, parece que entro mais no sozinho do vago..."


[Guimarães Rosa]



"Eu quero ser mulher de novo, estou cansada de virar homem tantas vezes ao dia, tendo que resolver a vida e o mundo."

[Martha Medeiros]

sexta-feira, 1 de abril de 2011




'Confesso que ando muito cansado, sabe? Mas um cansaço diferente. Um cansaço de não querer mais reclamar, de não querer pedir, de não fazer nada, de deixar as coisas acontecerem.'


[Caio F.]