segunda-feira, 23 de maio de 2011
“Veja, Lorena, aqui na mesa este anjinho vale tanto quanto o peso de papel sem papel ou aquele cinzeiro sem cinza, quer dizer, não tem sentido nenhum. Quando olhamos para as coisas, quando tocamos nelas é que começam a viver como nós, muito mais importantes do que nós porque continuam. O cinzeiro recebe a cinza e fica cinzeiro. O vidro pisa o papel e se impõe, esse colar que você está enfiando... é um colar ou um terço?
-Um colar
-Podia ser um terço?
-Podia.
-Então é você que decide.
(...)
-Veja Lorena... Os objetos só têm sentido quando têm sentido, fora disso... Eles precisam ser olhados, manuseados. Como nós. Se ninguém me ama viro uma coisa ainda mais triste do que essas, porque ando, falo, indo e vindo como uma sombra, vazio, vazio”
[Lygia Fagundes Telles- Os objetos]
(...)Um dia fico na praia. Mas fui verdadeira. Assumi minhas curtas verdades, assumi as mentiras compridíssimas, assumi fantasias, sonhos - como sonhei e como sonho ainda! Principalmente assumi o meu medo. Tudo somado, um longo plano de evasão fragmentado em fugas miúdas. Diárias. Que foram se multiplicando, não leio mais jornais, desliguei a TV com suas desgraças em primeiríssima mão, crimes humanos e desumanos, catástrofes e calamidades naturais e provocadas, ah! um cançaso. Por que ficar sabendo de tudo se nao posso fazer nada? Posso dar água aos flagelados ressequidos? dar uma toalha de rosto aos inundados? Hem?!... As tragédias se enredando sem trégua. Não tenho culpa se tomei horror pelo horror conformado. A miséria paciente. (...)
[Lygia Fagundes Telles, em As Horas Nuas]
"Volto às minhas lembranças que foram se acumulando no meu eu lá de dentro,em camadas, feito poeira. Invento (de vez em quando) o que é sempre melhor do que o nada, que nem chega a ser nada, porque meu coração pulsante diz EU SOU EU SOU EU SOU. Meu peito (rachado) continua oco..."
[Lygia Fagundes Telles]
quarta-feira, 11 de maio de 2011
segunda-feira, 2 de maio de 2011
" Estava a olhar para o vidro, com uma persistência de desesperado, contemplando as próprias feições derramadas e inacabadas, uma nuvem de linhas soltas, informes, quando tive o pensamento...[...]
Lembrou-se de vestir a farda de alferes. Vestia-a, aprontei-me de todo; e, como estava defronte do espelho, levantei os olhos, e...não lhes digo nada; o vidro reproduziu então a figura integral; nenhuma linha de menos, nenhum contorno diverso; era eu mesmo, o alferes, que achava, enfim, a alma exterior. Essa alma ausente[...] ei-la recolhida no espelho."
[Machado de Assis - Do conto: O Espelho]
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