segunda-feira, 5 de outubro de 2009


Quando menino, meu pai estendia os tapetes na janela.
Quando casado, minha mulher estendia os travesseiros na janela.
Novamente solteiro, estendo meus casacos na janela.
O sol do parapeito lava meus laços.
A sala que foi um dia o quarto que foi um dia o guarda-roupa.
Fui-me enforcando na gola, nervo de lã, lar reduzido.
Não deveria ter acreditado na revolução sexual.
Posso morar numa gaveta.
Morrer no cabide.
Não serei usado.
Até as frutas apodrecendo na cozinha não estão sozinhas.
Os insetos dividem sua despedida.
Não trago mais reservas.
Na infância, catava moedas que minha mãe deixava na bolsa.
Baldeava provisões, limpava enganos, respirava o couro.
Havia onde procurar.
Na vida adulta, caçava rostos amassados dos bolsos, cédulas dobradas nos forros, guardava visitas. Havia onde me procurar.
Esquecer nos enriquecia.
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[Fabrício Carpinejar]

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